Carlos Tê / Rui Veloso



No dia da comunhão solene

Fui de camisa engomada

Calças de terilene

E a garganta apertada



O velho alcino barbeiro

Levou-me o cabelo à faca

Fez-me um corte à francesa

Com cheirinho a talco e laca



Que domingo deprimente

Eu ali de fato e laço

A sorrir para o retrato

Com cartilha e fita no braço



O retrato que aqui vedes

Na cómoda da minha avó

Sou eu, sou eu

No dia da comunhão solene



O meu pai com o seu olhar

A ralhar na catedral

Não fosse eu destoar

E manchar o ritual



Com medo de fazer errado

Concentrei-me até ao fim

Para não trair o ar enlevado

Que a família tinha por mim



Mas quando tudo acabou

Corri a casa disparado

E ao vestir a velha roupa

Fiquei logo confortado



O retrato que aqui vedes

Na cómoda da minha avó

Sou eu, sou eu

No dia da comunhão solene

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